Depois de muitos anos (se calhar nem foi há tanto tempo assim), eles voltam a encontrar-se como que por um triz. Cruzam-se numa rua de Lisboa e ela sente de novo os seus dezanove anos e aquela tarde tempestuosa. Aquele momento parece vindo de uma tela de cinema, eles quase que se abraçam mas têm medo de se magoar um ao outro de novo. Ela acha que não o magoou assim tanto, mas afinal nem sempre é fácil perceber quando estamos a magoar alguém. Mas voltemos àquele momento: ele ainda tinha menos cabelo e ela um ar mais grave e sério devido a todas a vicissitudes da vida. Ele tinha umas calças azuis escuras e uma camisa azul também, mas de um outro tom. Ela trazia um vestido perfeitamente de inverno, e umas maçãs do rosto salpicadas de um blush bem rosáceo. O ar frio dele tinha desaparecido de repente, talvez porque estava mesmo muito frio na rua e era incómodo trazer mais. Existe uma nuvem de fumo baça vinda do carro dos vendedores de castanhas, e ela lembra-se do seu primeiro ano de faculdade. Ele quase que se sente embaraçado, mas todo este tempo lhe deu a certeza que poderia ser tudo diferente, e por isso esboçou o seu maior e infindável sorriso. É fantástico como tudo muda, menos o sentimento amargo e irregular que sempre pairou entre aquelas duas sensibilidades. Combinam um café para amanhã, naquele mesmo café que ilustra aquele postal maquiavélico que foi este reencontro. Esse café pode nem nunca mais existir: ou porque ela decide deixar de insistir numa coisa que nunca funcionou, ou porque ele não teve tempo, esqueceu as horas. Nessa mesma noite, ele envia-lhe uma mensagem a trocar o café por um cinema. Ela recusa, inventa uma desculpa.

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